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Pseudologia fantástica
Posted by Diana Magnavita
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03:04
Sentados em um bar Bia e Carlos conversam espontaneamente. O diálogo vai se tornando cada vez mais intimista e isso, deixa Bia um pouco desagradada, já que tem um distúrbio de personalidade anti-social, mas isso nunca pareceu ter interferido de forma tão ameaçadora em sua vida.
- Com quantas pessoas já teve relações sexuais? – Carlos questionou franzindo o cenho.
-umas 20. – Ela respondeu olhando para a xícara de café frio sobre a mesa, respirou fundo e o olhou nos olhos. – E você?
- Perdi totalmente a conta. – Ele disse galhofando.
- Por que os homens sempre tentam impressionar as mulheres com esse papo de “comi todo mundo”? – Ela debochou.
- Não disse isso. Apenas a verdade! – Ele se sacudiu desajeitado na cadeira.
Será que alguém mentia naquele momento? Carlos pareceu desagradado por diversas vezes com as alfinetadas da garota, mas a única pessoa diagnosticada com distúrbio de personalidade era ela.
Bia tinha vinte e sete anos e se passava por uma jovem de vinte, estudava letras em uma universidade renomada, mas nunca conseguiu passar do 6° semestre. Suas atitudes eram excêntricas, embora for excêntrico seja algo difícil de relatar, quando opiniões divergem, mas ela, conseguia vestir meias verdes com tênis azul e um vestido floral vermelho sangue. Usava uns óculos pequenos em seu rosto, que se escondia por trás do seu enorme nariz desproporcional para o seu conjunto. Embora, assim, Bia não era uma garota feia, era apenas desajeitada. O fato de já ter dormido com vinte caras, era mentira! Bia era virgem, nunca perdeu a virgindade, nem mesmo com tampão. Talvez, tivesse vergonha de admitir isso em público, que jamais houve um relacionamento em sua vida, um ser apaixonado, que a deliciasse de poesia e todo aquele clichê do romance.
Não era isso que incomodava Bia, não! Ela se achava feliz e desejada, pelo menos ela dizia isso. Todos os rapazes da faculdade eram apaixonados por ela e já tentou namorá-la, um de seus professores a convidou para dormir com ele, nasceu no Chile, seus pais eram parentes diretos de Fidel Castro, seu pai conheceu Che Guevara, sua irmã mais nova nasceu siamesa e seu avô morreu de catarata aos duzentos anos. Sim, ela queria que você acreditasse nisso tudo.
Na verdade, Bia era apenas uma garota solitária, que imaginava como seria sua vida, se não fosse essa. É uma patologia difícil de identificar, já que o paciente não contribui muito e quase sempre negam, suas verdades serem mentiras. Aos poucos, ela se isola do mundo e o mundo vai expulsando ela do eixo de controle e amigos, conhecidos e até mesmo os desconhecidos passaram a tratá-la como, a mentirosa.
Sofria de booling constantemente, isso foi se tornando constrangedor. Bia passou a não querer sair mais de casa, não queria dormir ou comer, mas a sua imaginação estava cada vez mais ativa e quase alucinada. No dia 20 de setembro de dois mil e dois, segundo a mesma, fora internada em um hospital psiquiátrico e fora diagnosticada com pseudologia fantástica, algo como mentiroso compulsivo. Suas mentiras passaram a fazer parte das células do seu corpo e era, como se precisasse delas para continuar a existir, respirar, viver.
Ela encontrasse sob observação médica, mostrou-se a pessoa triste que era por dentro e não se exteriorizava. Entregou-se ao estado de inércia e deixou que a respiração lhe faltasse. Depois do dia quinze de fevereiro de dois mil e quatro, todos esqueceram a existência de Bia, ninguém tocava em seu nome, ela caiu no total anonimato, que jamais desejou. Ela fora morta e enterrada para a cidade de Guanambi, onde nasceu, foi esquecida pelos familiares, amigos e inclusive, eu, mas Bia retornou nos meus pensamentos e percebi que estava viva em algum lugar, com outra vida, talvez, mais velha. Poderia ter tido filhos, casado, se curado, ou simplesmente, tido uma overdose daqueles, fortes medicamentos que habitualmente receitam aos pacientes dos centros psiquiátricos.
DianaMagnavita.